A primeira oficina de Design de Soluções Digitais para o fomento à cultura
O Ministério da Cultura (MinC), em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), promoveu, de 21 a 23 de fevereiro, a primeira Oficina de Design para Ativação Federativa de Soluções Digitais. O evento, realizado na Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UNB), reuniu 53 participantes, entre pessoas gestoras, pesquisadoras e agentes culturais.
O objetivo da oficina foi discutir e refletir sobre a qualificação do ecossistema de soluções digitais de gestão do fomento à cultura com foco na operacionalização da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), na modernização da gestão e nos modelos de governança do setor cultural. Para isso, foram utilizadas metodologias de design para construção de políticas públicas. As metodologias foram compartilhadas por membros do movimento FeliciLab, criado durante o enfrentamento à pandemia, como forma de atualização da transformação digital ocorrida nesse período e que permitiram aos participantes aprofundar as discussões sobre a origem dos problemas e desafios que enfrentam no dia a dia da gestão do fomento.
Durante três dias, a oficina levantou requisitos para o desenvolvimento de uma arquitetura colaborativa de sistemas digitais de fomento à cultura, bem como validou o fluxo de fomento, compreendendo a jornada e as
dificuldades dos entes federados e pessoas gestoras na adoção e utilização de soluções digitais para a gestão do fomento.
Esta publicação traz um resumo das principais discussões e uma prévia das descobertas iniciais que vão contribuir com o desenho e integração de soluções para o ecossistema de soluções digitais de fomento à cultura.
PNAB em execução
A Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), Lei Federal no 14.399/2022, prevê um investimento de R$15 bilhões, com repasses anuais de R$3 bilhões, entre 2023 e 2028, para Estados, Distrito Federal e Municípios. É um marco histórico, pois trata-se do maior investimento direto no setor cultural brasileiro, que resultará na ampliação do acesso à cultura e na efetivação dos direitos culturais da população brasileira em sua diversidade.
A federalização da política nacional de fomento à cultura, entretanto, enfrenta desafios que o Ministério da Cultura tem se debruçado. Um deles é o fortalecimento do ecossistema de soluções digitais de apoio à gestão dos processos públicos de fomento. O componente tecnológico não apenas impulsiona uma gestão mais transparente e estratégica dos recursos, contribuindo para uma distribuição mais equitativa e efetiva dos investimentos em cultura, como também possibilita a eficiência na coleta de dados e informações de avaliação da efetividade da política.
“Para alcançar uma atuação eficaz dentro de um contexto de restrições e da lógica democrática, é imperativo buscar a inovação, a tecnologia e o trabalho em rede. Prioridades claras emergem neste percurso: primeiro, qualificar a experiência do usuário, seja ele agente cultural ou gestor público, garantindo a participação plena dos cidadãos e uma gestão efetiva. Também é essencial otimizar o processo de gestão pública da PNAB, considerando as assimetrias nas capacidades institucionais dos entes federados. Por fim, é fundamental visualizar os resultados da política, traçando paralelos entre o caminho dos investimentos e o caminho dos dados, garantindo transparência e eficácia na aplicação dos recursos”, afirma Sofia Mettenheim, coordenadora-geral de Projetos Estratégicos no MinC.
Em constante evolução, o Ministério da Cultura tem atualizado os instrumentos de gestão para tornar a execução dos recursos mais eficiente e ágil. Durante a oficina, representantes do MinC apresentaram um modelo de fluxo de fomento à cultura, relativo ao Termo de Execução Cultural, previsto no Decreto 11.453/2023.
Fluxo simplificado do Termo de Execução Cultural
Dada a complexidade desse fluxo, a oficina propôs aos participantes a reflexão sobre as 6 macroetapas apresentadas abaixo, trazendo uma abordagem inovadora para iniciar o levantamento de requisitos para as soluções.
Design para quê?
A escolha de realizar uma oficina de design em vez de um levantamento de requisitos tradicional teve um objetivo claro: usar métodos colaborativos focados em resolver problemas ao invés de apenas coletar sugestões de soluções.
“Muitas pessoas pensam que design é só uma questão gráfica, mas não é. Tem muito mais a ver com equacionar e relacionar fragmentos de um processo de escuta qualificada que orienta as soluções. Nós trouxemos para a oficina alguns métodos híbridos de Design Thinking, que é um processo centrado em pessoas para achar soluções inovadoras para problemas de diferentes complexidades”, explica Ranielder Freitas, doutor em Design e facilitador da oficina.
Essa abordagem pode ser representada de forma geral pelo diagrama do duplo diamante:
A oficina centrou-se nas reflexões do primeiro passo: a imersão para a descoberta e entendimento inicial dos problemas. Além de aprofundar um processo já iniciado, de articulação federativa em rede, para qualificar e potencializar o ecossistema.
1 – Coleta de Problemas
Divididos em grupos, os participantes passaram por cada uma das macroetapas do fluxo do Termo de Execução Cultural para indicar os problemas que possuem com as soluções digitais disponíveis para gestão do fluxo.
2 – Árvore de Problemas
Nesse método, as pessoas foram convidadas a refletir sobre os problemas mapeados comparando-os com a estrutura de uma árvore: o tronco representa o problema principal, as raízes simbolizam as causas da dor, enquanto as folhas representam as consequências que o problema gera. Isso permite reclassificar problemas e identificar o cerne das questões.
3 – Validação dos Problemas
Com as árvores desenhadas, a oficina juntou todos os grupos novamente para uma validação coletiva dos problemas listados. Esta etapa foi mais uma camada de refinamento: os problemas semelhantes foram aproximados e mesclados de acordo com a validação dos participantes.
4 – Priorização inicial
Os problemas listados passaram por uma primeira rodada de classificação usando a matriz GUT, que considera critérios de gravidade, urgência e tendência para definir uma ordenação. O objetivo aqui não foi priorizar todos os problemas trazidos para resolução, mas sim realizar um momento prático de demonstração às pessoas participantes de uma das várias formas de refletir sobre priorização de demandas.
5 – Banco de Problemas
O Banco de problemas é um repositório resultante do diagnóstico realizado na oficina, composto com as principais questões identificadas e validadas por diversas pessoas, presentes na oficina, envolvidas no processo de aperfeiçoamento e melhoria das soluções utilizadas hoje no processo de fomento da Cultura no Brasil.
Sua estruturação implicou no armazenamento e categorização dos problemas em suas singularidades e como parte do universo de desafios. Os grupos de problemas, associando dores comuns, que eventualmente pertencem a áreas distintas, mas que podem ser agrupados por afinidade, tema ou persona, serão subsídios essenciais para construir o roadmap de desenvolvimento das soluções digitais para mapeamento e gestão cultural. O roadmap (Plano de Ação) orientará, as ações do ecossistema, de forma colaborativa e transversal, contando com a representatividade de pessoas que atuam na rede.
6 – Necessidade das pessoas
Encerrando o ciclo inicial de descoberta dos problemas, as pessoas foram novamente reunidas em grupos para fazer um exercício de empatia. Para cada causa de problema mapeada, foram levantadas as dores das pessoas envolvidas, agrupando-as em personas, ou seja, uma representação fictícia de perfis de pessoas reais.
Com isso, foi possível mapear as necessidades das principais pessoas envolvidas em cada problema. A partir das necessidades mapeadas e validadas em grupo, as equipes de desenvolvimento poderão elaborar as histórias, que guiarão o desenho das jornadas, experiências das pessoas usuárias e interfaces de interação para qualificar as soluções digitais para fomento.
7 – Estratégia de Governança Colaborativa
A governança colaborativa é o modelo de evolução da atual governança representativa e participativa. É uma abordagem que busca a participação ativa e colaborativa da sociedade na tomada de decisões e na implementação de políticas públicas. Tem como princípios básicos a transparência, a transversalidade/transdisciplinaridade, a horizontalidade e a diversidade, materializadas por meio de um processo de construção orientado por metodologias do design. A governança política é também tecnopolítica e alinha-se à reflexão e uso de tecnologias livres.
Próximos passos
A participação de pessoas agentes culturais convidadas foi proporcionalmente pequena, em relação ao total de participantes, não configurando um exercício de escuta na mesma profundidade e participação das pessoas gestoras. Com isso, pela avaliação da equipe do projeto foi percebida a necessidade de outros momentos de interação com as pessoas agentes culturais da sociedade civil.
Reforça-se que as pessoas participantes foram selecionadas com base na atuação profissional, região de origem e nível de maturidade no uso de soluções digitais, preservando um exercício de representatividade por gênero, território, raça/etnia e a participação de pessoa com deficiência.
A oficina é parte das atividades dos projetos para Ativação Federativa do Ecossistema de Soluções Digitais para o Fomento à Cultura e Qualificação do Ecossistema de Soluções Digitais para Mapeamento e Gestão Cultural, resultados da parceria entre a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Ministério da Cultura (MinC) por meio do Termo de Execução Descentralizada. Ancorados na Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PROEC/UFPR) e em atuação colaborativa com o Projeto Laboratório de Cultura Digital, os projetos foram estabelecidos para fomentar e apoiar o ecossistema de soluções digitais para gestão cultural, com ênfase em Softwares Livres, retomando as políticas da Cultura Digital no Governo Federal Brasileiro.